Silmara Silva (ONIJÁ)
Menina,
negra, pobre, sobrevivendo (ou subvivendo) sob as brutalidades causadas pela
extrema pobreza e pela violência dentro de sua própria casa. Esmeralda não
suportava mais apanhar de sua mãe, dominada pelo alcoolismo. Precisava fugir
daquela realidade em que era abusada sexualmente pelo padrasto e pelo tio. Aos
oito anos de idade, fugiu de casa rumo ao centro da cidade de São Paulo.
Desde muito
cedo, a rua parecia ser sinônimo de liberdade. A Praça da Sé parecia ser um
local de possibilidades para as crianças que Esmeralda ali via, nos tempos em
que ainda morava com a família e passava o dia com a mãe pedindo esmolas.
Chegava a pensar que ali poderia ser feliz, brincando e tomando banho no
chafariz.
Muito cedo,
ela conheceu a brutalidade não só da rua, mas também da Febem, por onde teve
cerca de 50 passagens. A primeira delas ocorreu no primeiro dia fora de casa, por
estar dormindo na rua, simplesmente. Espancamentos e humilhações eram
“oferecidos” por uma instituição que carregava o “Bem Estar” no nome – e só no
nome.
Se no início Esmeralda passou a roubar para se
alimentar, com o tempo as drogas dominaram seu cotidiano de tal modo que
passava dias sem comer direcionando todo dinheiro que conseguia para comprar
crack. Traficar também foi um meio para sustentar um vício que a destruía a
cada dia. Ela viu amigos sendo presos e morrendo num ciclo que parecia não ter
saída.
Em meio à
guerra urbana de uma São Paulo que a maioria das pessoas prefere fingir não
enxergar, Esmeralda andou na corda bamba durante anos. Passou a vestir-se como
homem como mecanismo de defesa contra a violência sexual, da qual já havia sido
vítima em casa e que também a atingiu na rua várias vezes.
Do fundo do
poço emergiu uma pessoa que neste livro relata sua trajetória e mostra como foi
capaz de mudar completamente a sua vida, lutando contra o vício e a convicção
de tantas pessoas que afirmavam que ela “não tinha mais jeito”. Como ela mesma
diz, conseguiu pescar usando a vara oferecida por aqueles que acreditaram em
sua recuperação. E de forma legítima, hoje, como ela também já afirmou, é
“porta voz de um povo que não consegue gritar”.
O livro é de 2000, escrito alguns
anos após sua saída da rua. Nele, Esmeralda menciona sua vontade de cursar uma
faculdade. Depois disso, ela graduou-se em Comunicação Social e publicou o
livro O diário da rua. Além disso,
faz palestras e é compositora e intérprete de samba. Aliás, Esmeralda cantando
é uma inspiração para a vida. E por descobrir o amor pela vida, Esmeralda não
dançou.
Neste livro,
Esmeralda, que sempre gostou de escrever poesias e letras de samba, escreve
mais que uma autobiografia. Escreve uma profunda reportagem, de dentro do
chamado submundo urbano, ao mesmo tempo em que revela a capacidade humana de
lutar contra a desumanização.
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