quinta-feira, 25 de julho de 2013

Esmeralda, por que não dancei: um relato de superação


Silmara Silva (ONIJÁ)

            Menina, negra, pobre, sobrevivendo (ou subvivendo) sob as brutalidades causadas pela extrema pobreza e pela violência dentro de sua própria casa. Esmeralda não suportava mais apanhar de sua mãe, dominada pelo alcoolismo. Precisava fugir daquela realidade em que era abusada sexualmente pelo padrasto e pelo tio. Aos oito anos de idade, fugiu de casa rumo ao centro da cidade de São Paulo.
            Desde muito cedo, a rua parecia ser sinônimo de liberdade. A Praça da Sé parecia ser um local de possibilidades para as crianças que Esmeralda ali via, nos tempos em que ainda morava com a família e passava o dia com a mãe pedindo esmolas. Chegava a pensar que ali poderia ser feliz, brincando e tomando banho no chafariz.


            Muito cedo, ela conheceu a brutalidade não só da rua, mas também da Febem, por onde teve cerca de 50 passagens. A primeira delas ocorreu no primeiro dia fora de casa, por estar dormindo na rua, simplesmente. Espancamentos e humilhações eram “oferecidos” por uma instituição que carregava o “Bem Estar” no nome – e só no nome.
             Se no início Esmeralda passou a roubar para se alimentar, com o tempo as drogas dominaram seu cotidiano de tal modo que passava dias sem comer direcionando todo dinheiro que conseguia para comprar crack. Traficar também foi um meio para sustentar um vício que a destruía a cada dia. Ela viu amigos sendo presos e morrendo num ciclo que parecia não ter saída.
            Em meio à guerra urbana de uma São Paulo que a maioria das pessoas prefere fingir não enxergar, Esmeralda andou na corda bamba durante anos. Passou a vestir-se como homem como mecanismo de defesa contra a violência sexual, da qual já havia sido vítima em casa e que também a atingiu na rua várias vezes.
            Do fundo do poço emergiu uma pessoa que neste livro relata sua trajetória e mostra como foi capaz de mudar completamente a sua vida, lutando contra o vício e a convicção de tantas pessoas que afirmavam que ela “não tinha mais jeito”. Como ela mesma diz, conseguiu pescar usando a vara oferecida por aqueles que acreditaram em sua recuperação. E de forma legítima, hoje, como ela também já afirmou, é “porta voz de um povo que não consegue gritar”.


O livro é de 2000, escrito alguns anos após sua saída da rua. Nele, Esmeralda menciona sua vontade de cursar uma faculdade. Depois disso, ela graduou-se em Comunicação Social e publicou o livro O diário da rua. Além disso, faz palestras e é compositora e intérprete de samba. Aliás, Esmeralda cantando é uma inspiração para a vida. E por descobrir o amor pela vida, Esmeralda não dançou.

            Neste livro, Esmeralda, que sempre gostou de escrever poesias e letras de samba, escreve mais que uma autobiografia. Escreve uma profunda reportagem, de dentro do chamado submundo urbano, ao mesmo tempo em que revela a capacidade humana de lutar contra a desumanização. 

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